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Foto do escritorMaria Eduarda Oliveira Pires

"Senhor, estou feliz, na sombra de suas asas"

Testemunho vocacional da Irmã Cecília Maria da Sagrada Face



Alguns podem se perguntar como uma pessoa, uma mulher, pode se tornar uma freira, uma Carmelita Descalça (de clausura, ainda por cima ) daquelas que vivem trancadas!


O que terá passado por sua cabeça e seu coração para tal decisão? Tentei explicar aos meus pais, irmãos, minha avó, meus parentes e amigos toda a minha ciência e a que eu não tinha também. Depois de 10 anos como carmelita, animo-me a contar a vocês...

Todas as histórias do chamado de Deus às almas são maravilhosas. Tal como quando subimos uma montanha e descobrimos paisagens únicas que ficam guardadas em nós. E que, embora tiremos ótimas fotos, não é o mesmo mostrá-las a outra pessoa do que ter experimentado. Por mais que se tente contar, mil matizes permanecerão reservados para a alma e para Deus.

Desde menina eu sonhava em casar, em outras épocas eu pensava: "ou freira ou casada, solteira nunca!" Mesmo com 15 anos, eu estava totalmente apaixonada por um menino, mas o Senhor me impedia e sempre me fazia querer algo mais, um “não sei o quê”.

Para fazê-los rir, no quinto ano, eu já tinha a Capela, embora faltasse a matéria-prima própria. Deus se valeu de um professor de Teologia que em suas aulas tudo me falava do senhor. Tudo me fazia ter desejos do céu. Comecei a ir à missa todos os dias, ia principalmente com uma amiga, sempre encontrávamos amigos na saída. Fiquei muito feliz por sermos tantos.

Comecei a ter os meus momentos de oração, a rezar o Terço (que me parecia muito chato) mas queria amar a Virgem!

Esse mesmo professor nos fez conhecer e amar Santa Teresa de Jesús, a de Ávila. Fiquei fascinada com sua intimidade com Cristo, porque embora eu não soubesse rezar,o livro de sua Vida, me fazia rezar com ela. Fazia-me comtemplar o Cristo.

Ele me ensinou a orar, que em suas palavras é "Tratar de amizade, estando muitas vezes a sós com alguém que sabemos que nos ama".

Também há uma outra frase muito sua que me encantava, e afirmava que para estar com o Bom Jesus não é preciso quebrar a cabeça, de que Ele não é amigo de que quebremos a cabeça,mas encontra alegria em nossso carinho e companhia.

Eu e outra amiga sonhavámos em viajar para a Europa, apostamos nas Loto ou na quina uma vez.



Talvez, adivinhando meus desejos, minha avó me convidou naquele ano para viajar para o velho continente e me pagou uma excursão. Por nada no mundo eu queria deixar de ir a Ávila (embora não estivesse no programa da viajem ). Eu queria ir para onde morava Santa Teresa -Mãe do Carmelo Descalço-, mas não tinha passado nada sobre freiras na minha cabeça.

Era 31 de dezembro, alguns amigos se ofereceram para me levar. Primeiro iríamos para Segóvia. Eu não sabia que São João da Cruz (Pai do Carmelo) estava enterrado lá. Quando quase "por acaso" vi a placa, perguntei se eles me deixariam descer para tirar algumas fotos. E ali sobre o seu túmulo, pedi com todo o fervor e ansiedade da minha alma, que me desse luz sobre a minha vocação. Mas ei, eu realmente não senti que ele estava me respondendo.

Quando chegámos a Ávila eram seis da tarde, em pleno inverno, quase noite. Fomos ao Mosteiro de La Encarnación, encontrei algumas moças encarregadas do museu que iam devolver as chaves às freiras. A porteira, vendo minha aflição, fez sinal para que eu fosse atrás delas.

Entraram num local todo em pedra (porque a construção é muito antiga, de mil e quinhentos e pouco), estava um frio congelante! E falavam atrás de uma madeira-depois aprendi que se chama torno-com uma freirinha simpatissíma. Eu disse às meninas para pedirem que ela ficasse, que eu queria falar com ela.

Pareceu-me que havia falado com a própria Santa Teresa. Só que comecei a chorar sem parar. As duas amigas que entraram comigo me deixaram sozinha.

A pequena freira chamada "Teresa de Jesús" disse-me que via em mim"uma vocação tão clara como a água, que eu não esperasse um anjo vir me falar ao ouvido..."

Internamente, enquanto chorava, senti que o amor infinito de Deus se oferecia a mim completamente. Como se de repente você descobrisse todo o amor que uma pessoa que você ama muito tem por você. Mas nunca seria capaz de imaginar que me amasse TANTO, TANTO. Senti-me muito pequena, e com vergonha por me sentir assim amada, mas ao mesmo tempo com uma felicidade muito grande e muito doce, daquelas que não se pode descrever.

Agora com o passar do tempo, vejo que estou cada vez mais consciente dos meus defeitos e limitações, que eu mesma desconhecia, mas também mais impressionada com o amor de Deus. Que Deus me ama muito, assim como sou!

Com estes sinais e graças de Deus, confesso que não foram suficientes para me sentir segura. Me matriculei na fonoaudiologia, torcendo para que não me passassem, depois fui para as letras.

Apesar das minhas dúvidas e inseguranças, nunca tive dúvida entre ser uma religiosa de vida ativa ou contemplativa. Eu queria ser de Nossa (e me disseram que "o Carmelo é todo de Maria") e de Santa Teresa. Finalmente entrei em um Carmelo em Buenos Aires, fiquei lá por 5 meses. Eu gostava da vida, mas não me sentia no meu lugar. Com toda a dor e escuridão em minha alma, saí pensando que o Carmelo tinha sido uma ilusão minha e não um verdadeiro chamado de Deus. Mas, apesar de todos os meus esforços, não conseguia tirar Carmelo da cabeça.

Enquanto isso, a noite começou a clarear e com tanto sofrimento, a paz se fez em minha alma. O Senhor revestiu-me de força, concedeu-me a firme e serena certeza do seu chamado. Essa noite escura durou apenas 3 meses, mas minha espera para chegar ao porto, 3 anos.

Com esta certeza em minha alma, vim bater as portas do carmelo de Santa Fe,Para qual sempre me senti atraida, Por aquilo que conhecia de ouvir falar, sentia-me atraída pela sua pobreza, radicalidade e alegria, mas principalmente porque o Senhor me fazia desejar.


Meus pais me pediram para estudar e terminar um curso antes de entrar novamente, também pareceu mais prudente às irmãs esperar, e meu pai espiritual achou melhor que eu obedecesse aos desejos de meus pais.

Foi mais uma dádiva de Deus estudar Enfermagem, e ter estado ao lado de tantos moribundos e doentes. Por via das dúvidas, todos os anos vinha bater às portas do mosteiro, para ver se as irmãs voltavam atrás. Minha obediência não foi muito perfeita!


Nesta espera toda a minha canção foi um poema escrito pelo Cardeal Newman, antes da sua conversão (resumido)

"Leva-me, Leva-me,

numa noite escura e densa estou longe de casa,

Leva-me, Leva-me

Não peço que mostres confins e horizontes.

Só mais um passo me basta, até que eu passe a noite escura,

até que finalmente veja o sorriso dos anjos.

Aquele que perdi, aquele que desejo para sempre.

Leva-me"

Finalmente consegui o diploma e no dia 8 de dezembro a Virgem me recebeu em sua casa. O nosso dulcíssimo Jesus deu-me perseverança nestes anos, e uma alegria muito profunda apesar da minha pobreza, de pertencer só a Ele, de ser sua esposa.

De poder ajudá-lo na minha pequenez, salvar as almas, peas quais Ele é apaixonado, de poder ajudar os seus ministros, os sacerdotes, o Santo Padre e a Igreja peregrina em Santa Fé, bem como a nossa pobre e sofredora Pátria.

Santa Teresa Benedita da Cruz (outra grande santa carmelita) me diria:

"Você não é médica nem enfermeira,

não podes curar suas feridas.

Você está recolhida em sua cela e não pode socorrê-los.

Ouves o grito dos agonizantes

e gostarias de ser sacerdote e estar ao seu lado.

Olha o crucificado, unido a Ele és como o omnipresente... Com a força da cruz podes estar em todas as frentes de combate,

em todos os lugares de aflição".


Espero que me perdoem por não poder dizer tudo em poucas palavras, que estas valham como ação de graças a oração de tantos a quem devo minha vocação. A começar pela minha “bisavó” Josefina, bem como as queridíssimas irmãs da Encarnação, muitos sacerdotes e amigos, principalmente meus pais, irmãos e minhas irmãs nesta comunidade que Deus me deu de presente.

Uma pobre e feliz carmelita descalço,

que espera poder cantar a cada dia,

com voz mais clara e mais ardente

As misericórdias do Senhor!


irmã Cecília Maria da Sagrada Face,OCD



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